terça-feira, 9 de março de 2010

Cheias no vale do Zambeze


Caia, o posto administrativo de Sena está isolado do resto do país, por via terrestre, devido à subida do rio Zambeze. O distrito do Búzi e o posto administrativo de Chiramba, em Chemba, continuam na mesma situação, o primeiro devido ao curso da bacia que ostenta o mesmo nome e o segundo por causa do rio Púnguè.

Apesar das ilhas dos distritos de Marromeu e Chemba, em Sofala, estarem na iminência de registar inundações, o INGC assegura que todas as pessoas que ali viviam fixaram as suas residências nos centros de reassentamento.

O trânsito continua condicionado na Estrada Nacional Número Seis (EN-6), ao mesmo tempo que assegurava que a situação está controlada. Por outro lado, em caso de qualquer complicação, já está posicionado no Centro Operativo de Emergência (CENOE), em Caia, um contingente militar para salvar as vidas que, eventualmente, venham a necessitar de socorro imediato.

segunda-feira, 8 de março de 2010

A implantação da rede judiciária

A implantação da rede judiciária (nomeadamente tribunais, procuradorias, o IPAJ, a polícia de investigação criminal, as cadeias, os médicos legistas, etc,) em todos os distritos de Moçambique continua a ser deficiente e não existe uma estratégia clara e concertada de implantação das instituições do sector da justiça, afectando em grande medida o acesso à justiça pelos cidadãos. Ao longos dos 5 anos da sua implementação, o PARPA II não criou condições satisfatórias nesta área, colocando enormes desafios ao Governo. Esta é uma das conclusões de uma avaliação levada a cabo pelo Centro de Integridade Pública (CIP) com o objectivo de medir o impacto do PARPA II no sector no acesso à Justiça.

A ambição de se estender a rede judiciária a todo o país está longe de ser concretizada, havendo ainda muitos distritos que não dispõem de qualquer instituição “formal” de administração da justiça. Além do mais, embora a tendência seja mudar a situação, a implantação das instituições de administração da justiça em Moçambique não está harmonizada. Continuamos a encontrar distritos com tribunal em funcionamento, mas sem procuradoria nem IPAJ; distritos com procuradoria em funcionamento, mas sem tribunal nem IPAJ; distritos com tribunal e procuradoria, mas sem IPAJ; distritos com tribunal, com procuradoria coberta por acumulação, mas sem IPAJ; distritos com tribunal, mas cobertos pelo IPAJ e pela procuradoria em regime ambulatório.

A organização judiciária é a pedra angular sobre a qual gravitam quase todas as questões relativas ao sistema de administração da justiça. A opção de fazer coincidir a divisão judicial com a divisão administrativa tem conduzido a um esforço gigantesco de extensão de tribunais judiciais em todos os distritos, independentemente das características de que disponham, da população habitante, do grau de desenvolvimento sócio-económico, das particularidades da procura sócio-jurídica. Mas o ritmo dessa expansão continua lento.

Outro aspecto crítico é que a estratégia de melhoria do acesso à justiça está centrada no topo e não na base, nomeadamente com a perspectiva de criação de tribunais superiores de recurso. Funcionarão três tribunais superiores de recurso em todo o país, com competências para julgar os recursos das decisões dos tribunais de província.

Mas, como constatamos da avaliação, actualmente sobem para o Tribunal Supremo apenas cerca de 0,31% das decisões proferidas pelos tribunais de província. Não sendo previsível que o número de recursos suba estrondosamente, significa que a médio prazo os tribunais superiores de recurso, no seu conjunto, terão pouquíssimo trabalho e muito menos o Tribunal Supremo. Cremos, por isso, que os tribunais judiciais de distrito e os tribunais comunitários deveriam ser a prioridade do sistema. Ao reforçar-se o topo do sistema, em detrimento da base (por onde ingressa a maior parte dos casos), os cidadãos continuam a estar longe do sistema de justiça e não se resolvem os problemas estruturais da justiça moçambicana.

Esse distanciamento do sistema em relação aos cidadãos acentua-se se tivermos em conta o estado de abandono dos tribunais comunitários: desde 1992 que a lei que os cria não é actualizada; a mesma lei não foi regulamentada; não houve nenhum processo de renovação do corpo de juízes; os juízes em exercício não recebem nenhum salário ou subsídio por parte do Estado; os tribunais funcionam sem qualquer acompanhamento; o estado não disponibiliza as condições de trabalho; etc. Ainda assim, a experiência e vitalidade dos tribunais comunitários revelam a importância que assumem para os cidadãos, enquanto instâncias de referência para a manutenção da paz social.

Nenhuma reforma da administração da justiça em Moçambique poderá responder satisfatoriamente aos problemas de acesso à justiça sem contemplar as instâncias comunitárias de resolução de conflitos, em particular os tribunais comunitários. Na verdade, tanto os tribunais judiciais, como as instâncias comunitárias, isoladamente, não poderão fornecer todas as soluções para o acesso à justiça. Será, antes, necessário encontrar pontes de diálogo e de articulação que permitam a construção de um sistema integrado, mais próximo dos cidadãos e célere, capaz, por um lado, de interpretar correctamente os contextos políticos, económicos, sociais e culturais em que se insere, e, por outro lado, de satisfazer diferentes necessidades de tutela jurídica.

Podemos, assim, concluir que ficou por concretizar uma das preocupações centrais do governo para área da justiça: repensar a organização jurídica e judiciária, tendo em conta a existência de uma multiplicidade de sistemas de administração da justiça (PARPA, parágrafo 257). O desempenho dos tribunais em diferentes escalões é diferenciado. O Tribunal Supremo continua a julgar muito pouco, progressivamente aumentando, desse modo, o número de processos pendentes. O Tribunal Supremo não se livrou, ainda, do epíteto por que é conhecido entre os magistrados e advogados: o cemitério de processos.

A formação e colocação de novos magistrados, a introdução de metas de desempenho para os juízes, a monitoria do actividade dos juízes e as reformas processuais introduzidas (sobretudo no Código de Processo Civil), têm estimulado o aumento da produtividade dos tribunais. Os processos pendentes tendem a baixar. Há, contudo, que ter atenção para os seguintes aspectos:

n existência de eventuais diferenças de desempenho entre tribunais e entre secções do mesmo tribunal;

n evitar a tendência para julgar prioritariamente os processos mais simples e os que asseguraram maior participação emolumentar (de modo a cumprir com as metas), ficando os outros para trás, ainda que tenham entrado primeiro;

n necessidade de investigar o que estará na verdadeira causa em relação aos processos que findam “por outros motivos”;

n o alargamento das competências dos tribunais judiciais de distrito exige que a base do sistema seja reforçada com mais profissionais (juízes, procuradores, polícias, assistentes e técnicos jurídicos; etc) e com melhores equipamentos, instalações e estruturas organizativas;

n necessidade de apostar de forma mais firme nos meios alternativos de resolução de conflitos. A resolução extrajudicial dos conflitos pode contribuir para aliviar os tribunais da pressão a que estão sujeitos (e que, em princípio, tenderá a subir). No entanto, há que ter as devidas cautelas para assegurar que as vantagens de resolução célere dos conflitos não signifique prejudicar os direitos elementares dos cidadãos.

O IPAJ tem crescido nos últimos anos, aumentando o número de delegações distritais. Os serviços públicos de assistência jurídica e judiciária têm sido alargados por força dos protocolos que o IPAJ assinou com escolas superiores de direito e com uma organização da sociedade civil. No âmbito desses protocolos, estas instituições prestam assistência jurídica gratuita aos cidadãos carenciados, cabendo ao IPAJ o seu credenciamento e a monitoria da actividade.

Apesar dos avanços, o IPAJ enfrenta o desafio estrutural de conceber e executar uma estratégia consistente para, por um lado, garantir a continuidade dos técnicos e assistentes jurídicos na instituição e, por outro lado, assegurar que lhes seja paga uma remuneração para que, de facto, exerçam as suas funções sem cobrar honorários aos cidadãos. É importante também que haja articulação entre o IPAJ e a Ordem dos Advogados, sobretudo no que respeita à acção dos estagiários. Todavia, passados 15 anos desde a criação da Ordem o estágio não está estruturado e aquela instituição não contribui minimamente para o acesso à justiça por parte dos cidadãos mais pobres.

Tendo presente o que temos vindo a mostrar, concluímos que em Moçambique o acesso à justiça continua muito selectivo. Por um lado pode-se afirmar que, embora não seja possível saber com exactidão o número de pessoas que se colocam nessa situação, uma parte considerável dos cidadãos, mesmo querendo, não tem como chegar aos tribunais judiciais. Por outro lado, a avaliar pelo volume de processos que entram nos tribunais mas que não são resolvidos, os níveis de procura não satisfeita ainda são enormes. Mas mais preocupante do que esta dura realidade, é não se perceber no sistema uma estratégia clara e concertada do rumo do sistema de administração da justiça para responder aos problemas de acesso à justiça. Os cidadãos mais pobres são, sem dúvidas, os mais prejudicados.

Para além do debate em relação à expansão da rede judiciária, o relatório discute aspectos ligados à reforma legal, formação de magistrados, o papel dos tribunais comunitários, a articulação da Ordem dos Advogados com o IPAJ, entre outros.

O relatório do CIP sobre esta matéria está disponível aos interessados.

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